segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

A Indústria da Deficiência


por Anderson Tabuh Paz Tavares Correia

Você sabe quem são as pessoas com deficiência. Uma resposta curta responderia algum conceito que contemplasse pessoas cegas, surdas, com síndrome de down, amputados, etc. Eu gosto muito da definição da Convenção da ONU:

"Pessoas com deficiência são aquelas que têm impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdades de condições com as demais pessoas."

Essa definição deixa de lado um antigo olhar clínico, médico, e passa a abordar um olhar social e funcional sobre a pessoa. Ela tem algum impedimento de longo prazo (não serve uma perna quebrada, por exemplo) e esse impedimento, em interação com uma barreira, obstrui sua participação. A deficiência não está na pessoa, mas na interação dela com uma barreira. Ao se retirar uma barreira, a pessoa continua com o seu impedimento, mas passa a ter igualdade de condições no acesso e permanência aos bens e serviços sociais.

Pois bem. Existem diversos profissionais que trabalham pela quebra dessas barreiras. Um bom exemplo é o intérprete de língua de sinais, que capta um discurso em Português e o traduz para Libras, por exemplo, tornando a comunicação acessível às pessoas surdas. Outro exemplo é o áudio-descritor, que transforma em palavras aquilo que é visual, deixando pessoas cegas e videntes em igualdade de acesso à comunicação. Podemos citar muitos outros profissionais que, ao atuar, quebram barreiras e possibilitam as condições ideais para o empoderamento das pessoas com deficiência.

Por outro lado existem pessoas que se aproveitam da situação da deficiência. São aqueles que não querem ver o empoderamento. Gostam mesmo de ver a pessoa com deficiência eternamente dependente, impedida de tomar decisões. Destaco dois tipos de atitudes mais frequentes, embora a lista deva ser muito maior:

1. Pessoas oportunistas. Muitas vezes têm ideias inovadoras, revolucionárias, ganham prêmios, ganham dinheiro, MUITO DINHEIRO, mas em algum momento percebem que "o buraco é mais em baixo", arranjam uma desculpa qualquer e saem de fininho. Não sabem lidar com críticas, e em contato com pessoas que entendem de verdade se fazem de bobas e evadem. O que eles querem mesmo é lucrar.

2. Pessoas assistencialistas. Seu discurso diz que as pessoas com deficiência são vítimas, precisam de cuidados especiais. Por trás do discurso há uma grande preocupação em manter tudo sob seu próprio controle, tomar as rédeas da vida dos outros. Entre essas pessoas há ainda os chamados "especialistas em deficiência". Cansei de ver “Doutora Fulaninha, especialista em Cegos”, e “Doutor Beltraninho, especialista em Surdos”. Trabalham para continuar sendo necessários. Não desejam a independência ou autonomia de ninguém.

Uma última reflexão: não me preocupa em nada se uma pessoa sem deficiência se diz militante da causa. Eu tenho pele branca, mas não quero viver em um mundo racista; sou homem, mas não quero viver em um mundo machista. Ninguém precisa ser homossexual para lutar pelos direitos dos gays, nem pessoa com deficiência para lutar por acessibilidade e inclusão. O que me preocupa de verdade são aqueles que se aproveitam da situação do seu próximo, que tiram proveito disso, fazem da barreira fonte de lucros.

Obviamente, eu defendo que um profissional, seja lá de que área ele for, deve ser remunerado de acordo com sua capacidade técnica, seu esforço, e para isso precisa estudar, se atualizar, etc. Mas em nossa área eu só posso chamar de sério um trabalho que objetiva a autonomia, a independência e o empoderamento da pessoa com deficiência. Se fugir disso, para mim, não presta.

Como diz Pedro Luís (e a parede), "tão vendendo ingresso pra ver nego morrer no osso". E o ingresso não é nem um pouco barato...



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